Dolomitas ou Doloridas???

Maria Eugênia, publicitária, ex-corredora e ciclista atualmente é casada, mãe de 3 filhas e começou a pedalar após os 40 anos. Agora ela conta como foi o super desafio de treinar para a Maratona Dolomitas que aconteceu em 09/07/2019.

Vejam que relato inspirador!!! Comente!

Dolomitas ou Doloridas? 

Eu já estava pedalando há mais de um ano quando apareceu a oportunidade de me inscrever para a Maratona das Dolomitas, região da Itália que até então nunca tinha povoado meus planos turísticos. Tudo começou com um monte de mensagens no nosso grupo de Instagram da LuluFive do tipo… “Vamos para as Dolomitas?””Meu cê tá loka?” “Bora” e a outra: “Bora”. E de uma hora para a outra todo mundo confirmou e a viagem se tornou real.  E sabe como é prova na Itália, né? Para quem chegou no ciclismo há pouco tempo, parece (e é) coisa de gente grande.

Chegando em São Paulo depois das férias em janeiro, fui correndo bater um papo com a minha nutricionista e assim começamos o ano, com um comprometimento de perder 4 kgs até a prova e de treinar, treinar e treinar até chegar no ponto certo. Seguindo minha coach, minha nutri e ouvindo recomendações do meu marido, comecei tudo de uma forma bem tranquila. É normal você começar o treino com um certo desespero quando tem uma prova grande pela frente. Dá a impressão de que não vai dar tempo de treinar tudo, perder peso e de perder o medo, que nesse momento nem era tão grande por que eu não fazia idéia da enrascada em que eu tinha me metido.

Mas mesmo com essa aflição, começar forte pode causar lesão se houver overtraining ou um belo dia você pode se dar conta de que aquela amiga tão querida e companheira, a bike, já está começando a te cansar. E com isso pegar um belo bode não só dela mas também do esquema de treinos, compromissos, madrugadas, e tudo o que nós ciclistas conhecemos tão bem. Então fica aqui a dica #1. SEMPRE seguir o que o seu coach diz. Conversar, trocar idéias, estar muito próximo dele (a). Siga o planejamento, não pule etapas. E fique tranquila que dá tempo.

Enquanto isso, entrei de cabeça na dieta e com isso o resultado apareceu. Emagreci não só 4 mais 5 kgs, aprendi a comer direito durante uma prova longa, beber a quantidade certa de fluidos e parar nas horas-chave.  Priorizei treinos no final de semana para ter certeza de que iria cobrir toda a quilometragem necessária para chegar preparada no dia 7 de julho. Conversei com a família (fica aqui a dica #2), expliquei o que estava fazendo e com isso trouxe todo mundo para dentro do meu compromisso, o que ajudou muito para gerenciar as cobranças daqueles que estão de fora desse mundo delicioso, complexo, maravilhoso, intenso e viciante do ciclismo.

Foram várias idas à Campos, treinos que pareciam infindáveis, horas em cima da bike subindo e subindo e mesmo depois de muito subir, a altimetria ainda parecia nem chegar aos pés dos 3.100m da prova na Itália. Mas seguimos firmes, eu e minhas amigas e companheiras de treino, ultrapassando cada dificuldade e cada barreira, as vezes juntas, as vezes sozinhas mesmo. Na maioria das vezes xingando mas ao final sempre comemorando.

Na minha cabeça o preparo físico é totalmente independente do mental. Logicamente que quanto mais você entra em forma e consegue cumprir seus treinos, fazer coisas que nunca imaginou que seriam possíveis, isso vai automaticamente auxiliando a cabeça a entender que você vai conseguir terminar a prova. Mas mesmo assim a minha cabeça fantasia coisas incríveis, como na primeira vez que eu subi a Serra Velha. Eu estava esperando uns 7 Tirassaias coladinhos um no outro e quando cheguei lá em cima, tranquilamente disse: Caramba, mas no final era só isso? Imagina as Dolomitas? Na minha cabeça seria como subir o Everest de bicicleta.

Todo mundo me diz que eu sou mais forte do que eu penso e isso, já percebi, é bem comum com outras ciclistas também. Com isso, completei todo o treino às vésperas da viagem e ao mesmo tempo em que me sentia preparada fisicamente, estava me pelando de MEDO. E se acabar o gás no meio da montanha? E se eu não conseguir subir? E se eu tiver que empurrar a bike?  E se chover e fizer muito frio? E se as subidas forem paredões e eu cair de lado? E se eu me perder das minhas amigas, furar pneu, estourar corrente? E se me atropelarem? Gente de Deus, quanta neura – mas acreditem, todos esses pensamentos em algum momento passaram pela minha cabeça.

Finalmente chegamos à Itália e tivemos 3 dias de Training Camp para nos ajustarmos, reconhecermos as montanhas, entrarmos no clima e acostumarmos um pouco o nosso corpo com o fuso horário, com a comida e com aquele bando de coisas novas. Isso foi essencial. Dica #3 – não chegue na prova muito em cima da hora, ainda mais se for em um local novo, diferente do que você conhece. Pode ser que tudo dê certo se você chegar de véspera, mas nada melhor do que saber onde você está se metendo com um pouco mais de propriedade.

O primeiro dia do TC deixou todo mundo meio apavorado – Passo delle Erbe. Pensa numa subida ingrime que nunca acaba, sabe? E que parece que ainda faltam umas 2 marchas na bicicleta pra você conseguir rodar numa cadência aceitável. Nada a ver com nada que a gente tinha feito antes. Itapeva, Toriba, Serra Nova, Serra Velha, rá rá rá, nem aos pés. Então a chegada lá em cima foi meio tétrica e todo mundo chegou com os olhos arregalados pensando: O que raios vim fazer aqui?

Mas o segundo dia do TC já foi mais tranquilo. Fizemos 4 das 6 montanhas da prova no sentido contrário e já pudemos ter uma boa idéia do que nos esperava no domingo: Gardena, Sella, Pordoi e Campolongo. Testamos tudo: timing do gel, do banheiro, comidas sólidas, ingestão de fluidos. Subidas longas mas mais proximas daquilo que estamos acostumadas. Já deu um outro ânimo.

No terceiro dia nós descansamos e domingo chegou. Acordei super cedo, ritual que eu sempre sempre repito em dia de prova – dica #4. Noite antes de prova a gente dorme mal mesmo, e tudo bem – depois recupera. Antes de levantar mentalizei por bons 20 minutos só coisas boas. Subidas fortes, sensação de conforto na bike, visualizei a linha de chegada e também visualizei a conquista de cada montanha, uma por vez.

Aliás, dica #5, analisando as 6 montanhas resolvi “resolver uma montanha por vez”. O pensamento: “fiz uma, faltam 6” particularmente não me ajuda em nada e na verdade só atrapalha. Então resolvi ir com outra cabeça. Cada montanha uma batalha e uma vitória, sem pensar no total. Quando percebi, quase 7 horas depois, tinha terminado todas. Ah, também amei deixar o Garmin no “battery save mode”onde ele fica a maioria do tempo apagado. Assim acabei olhando ao meu redor e apreciando tudo o que a corrida estava me oferecendo.

E no final tudo fluiu naturalmente. Me senti MUITO bem, sem nenhuma dor, sem nenhum medo e com muita vontade de aproveitar, curtir, absorver aquela experiência maravilhosa. Fiz a prova com as minhas duas amigas queridas e Lulus Mayra e Carol. E fomos juntas, dando suporte uma a outra, com presença, palavras de estímulo e com aquele sorriso, carinho e cumplicidade que quem é ciclista e desenvolve amizades em cima da bicicleta, entende. Chorei no final do Valparola com um vento infernal que não nos deixava ir pra frente. Com isso fiquei ofegante, não conseguia respirar e atrás de mim ouvi a voz da Mayra gritando: Vai Mazinha tá acabandoooo, pensa nas suas filhas! Tudo bem que eu chorei mais nessa hora pensando nas minhas filhas, mas isso me ajudou TANTO, que eu não tenho como explicar. Obviamente o fotografo pegou a cara de choro numa foto fantástica e inesquecível. E logo já vi a Carol me esperando no topo com um sorriso no rosto  e depois de um abraço, começamos a descer juntas. Cruzamos a linha de chegada uma ao lado da outra e foi um momento maravilhoso e inesquecível. Abracei minhas amigas, depois abracei minhas coaches e todas choramos juntas. Por fim abracei o Flavio, meu maior incentivador e maior companheiro de vida e de bike, que tinha terminado a prova longa e estava feliz com a bike numa mão e uma cerveja na outra.

Em suma…foi uma experiência mágica, um sonho, uma conquista sem tamanho. Muita dedicação, esforço, força de vontade. Sem as Lulus não teria chegado até lá. E tantas outras pessoas que me ajudaram no trajeto. E se ainda posso dar uma última dica, a #6 – sempre tenha no seu radar um novo desafio. Eles te mantem viva, focada e te dão um propósito. Seja no mundo dos esportes, seja em qualquer outro lugar. Escolha um desafio que seja desafiador mesmo, nada de sabotagens. Depois, planeje, treine e execute. A sensação de missão cumprida é uma das melhores que existem – tipo quando a gente escolheu sair da escolinha num pedal em Romeiros e, depois do Tirassaia, já consegue avistar o carro lá de cima da última descida, ao lado da barraca do côco. Entendedores entenderão.

Afinal… Dolomitas ou Doloridas? Os dois. Valeu cada esforço, cada minuto de dedicação e sofrimento. Experiência que entra para a lista de conquistas inesquecíveis da vida. E bora treinar para a próxima aventura!

0 resposta

  1. Maravilhoso amiga, você escreve muito bem.
    Vivi cada um destes momentos com vocês, estava lá quando vocês chegaram. Senti em mim a emoção de completar.
    Nada fácil o processo dos treinos, porque o resto entra em jogo , família , trabalho, rotina.
    Mas é isso! Ter um desafio , planejar, cumprir e ser flexível. Nada será 100% daquilo que inicialmente voce planeou e ótimo !!! Porque pode ser ainda melhor, diferente e enriquecedor.
    Que venham muitos desafios! Você o seu honrará não mehor qualidade tenho certeza !!!
    LovU

  2. Ma querida, foi incrível poder te ajudar a se preparar para esse desafio. E mais incrível ainda foi ver tudo bem de pertinho e conhecer aquele lugar mágico com vc. Muito orgulho da atleta que está se tornando, se superando a cada dia.
    E sim, você não tem ideia do quanto é forte!

  3. Ma querida lindo texto cheio de amor e inspiração. Precisamos disso todos os dias, pois nossa rotina nunca é fácil mas juntas somos infinitamente mais fortes.
    Super privilégio poder conviver com sua força. Bj

    1. Que super relato! Amei saber mais detalhes dessa sua conquista! Só mais uma para a sua coleção! Já curiosa para sabe da próxima! Parabéns amiga! Lindo de ver a sua dedicação!mega exemplo a ser seguido!

  4. E é isso! Esse tesão de missão cumprida é o máximo,em todos os passos da vida! E sempre ter a garra de chegar aonde queremos, pensando acima de tudo em nós mesmas, afinal, esse sabor só a gente consegue sentir no nosso coração! E é ele que nos recarrega para levantar a cada dia sorrindo! Parabéns Ma!!! Beijo

  5. Emociona só de ler sue relato …. quem é fã de esporte e faz com amor, sabe que estas emoções são genuínas e levaremos para o resto de nossas vidas. Orgulho de você! Bjs da sua “companheira” corredora !

    1. Ma, como já lhe disse milhões de vezes – VOCÊ É MINHA INSPIRAÇÃO!!
      Eu, ciclista mirim (entrando agora para o quinto mês em cima de uma bike) rumo ao meu primeiro desafio … L’Etape, quero que saiba: suas palavras me acolhem e já me fazem sentir vitoriosa por todo o esforço e superação nestes tão poucos dias de intimidade com a bike. Tenho certeza que ao concluir o L’Etape (em apenas 6 meses de conhecimento e treino) terei dado um “Passo” mais que transformador, onde prematuramente nascerá uma mulher com sede de superação e desafios maiores.

      Só tenho que agradecer a família LuluFive por plantar a semente do desafio em mim!! Amo todas vocês!! Parabéns!!
      Assinado: uma mulher em transformação.

  6. Realmente incrível seu relato e sua garra! Sou também apaixonada pelo esporte e me vi em cada etapa da sua história!! Parabéns por tudo! Qual será seu próximo desafio??
    Beijinhos e nos encontraremos pedalando por aí.

    Juliana Cerize

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